Warley Belo
Advogado Criminalista
Presidente da OAB/MG – Subseção Venda Nova
Mestre em Ciências Penais / UFMG
Introdução
A defesa criminal sempre é desafiadora. Entretanto, em casos de crimes tributários, apresenta desafios significativos, especialmente quando se trata da aplicação da teoria do domínio do fato. Este artigo foi escrito com base em uma alegação final que fiz e discutirá as estratégias de defesa eficazes, com base na jurisprudência e na literatura especializada.
Dos Desafios da Defesa em Crimes Tributários
Os casos de crimes tributários frequentemente envolvem questões intricadas relacionadas à autoria e à responsabilidade penal dos administradores de empresas. A teoria do domínio do fato afirma que é autor quem decidiu e/ou ordenou a prática de crime a subordinado ou sócio seu ou mesmo por não evitar a ocorrência desses ilícitos. Em palavras simples, os administradores de uma empresa podem ser responsabilizados criminalmente não apenas por cometerem atos ilícitos (direta ou indiretamente), mas também por não agirem de maneira adequada para evitar que esses atos ocorram, desde que tenham o controle e a influência necessários sobre as operações da empresa. Isso é especialmente relevante em empresas familiares, onde todos os sócios geralmente têm amplos poderes de administração e controle. Essa teoria do domínio do fato, entretanto, não pode ser aplicada como presunção automática de autoria para evitar o que chamamos no Direito de responsabilidade objetiva (culpar alguém pelo simples fato de ser sócio de uma empresa, por exemplo). Mesmo porque a teoria do domínio do fato possui o objetivo de distinguir as figuras de autor e partícipe e não de servir como fundamento (e presunção) “de uma posição que não ocorreria de outra forma”, em razão da insuficiência probatória da autoria (GRECO, Luís, et. all. Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal brasileiro, 2014).
A jurisprudência, como exemplificado na AP 987/MG e no AgRg no AREsp 1390932/PR, destaca a necessidade de provas substanciais para estabelecer a autoria e a ligação direta entre o acusado e o crime tributário. Colecionamos ainda:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SONEGAÇÃO FISCAL. RESPONSABILIZAÇÃO PENAL. TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO. INAPLICABILIDADE. INEXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. DOLO. ESSENCIALIDADE. DESCRIÇÃO DE CULPA EM SENTIDO ESTRITO. INCOMPATIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (AgRg no REsp 1874619/PE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 24/11/2020, DJe 02/12/2020)
É inconcebível a imputação dos delitos descritos na exordial acusatória com base, única e exclusivamente no contrato social da empresa, sob pena de caracterização de responsabilidade penal objetiva.
Da Literatura Jurídica
A literatura jurídica fornece insights valiosos sobre a defesa em casos de crimes tributários. Livros como “Direito Penal: parte geral” de Cleber Masson e “Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal brasileiro” de Luís Greco et al. discutem as teorias de autoria e o conceito de domínio do fato, esclarecendo sua aplicação e limitações.
Das Estratégias de Defesa Eficazes
Com base nas jurisprudências citadas e na literatura jurídica mencionada, a defesa em casos de crimes tributários deve se concentrar na falta de provas concretas de envolvimento direto do acusado no crime. Além disso, é fundamental argumentar que a posição de gestor ou administrador de uma empresa não implica automaticamente em responsabilidade penal. A defesa deve demonstrar que o réu não tinha o controle efetivo sobre as operações tributárias da empresa e que sua conduta, se existiu, não foi dolosa, mas, sim, negligente ou imprudente.
Conclusão
A defesa em casos de crimes tributários é um desafio complexo que exige uma análise minuciosa dos documentos, muita conversa com os contadores, o entendimento das teorias de autoria e uma abordagem estratégica. Com base na jurisprudência e na literatura jurídica citadas, é evidente que a teoria do domínio do fato não pode ser aplicada sem provas substanciais de envolvimento direto do acusado. A defesa deve se concentrar em mostrar a falta de provas de autoria e demonstrar que a posição do réu na empresa não implica automaticamente em responsabilidade penal.
Este artigo foi escrito por Warley Rodrigues Belo, advogado com registro OAB/MG 71.877, e serve como um guia para compreender os desafios e estratégias da defesa em casos de crimes tributários.
Bibliografia:
- Masson, Cleber. “Direito Penal: parte geral” (2017).
- Greco, Luís et al. “Autoria como domínio do fato: estudos introdutórios sobre o concurso de pessoas no direito penal brasileiro” (2014).
Jurisprudência: AgRg no REsp 1874619/PE, AP 987/MG e AgRg no AREsp 1390932/PR.